
Ademilson Zamboni — oceanólogo e diretor-geral da Oceana
O documentarista e naturalista britânico David Attenborough — cujo trabalho se tornou a cara e a voz da preservação dos oceanos no mundo ao longo das últimas décadas — declarou recentemente que, após quase 100 anos de vida, entende agora que o lugar mais importante do planeta não é a terra, mas os mares. "Se salvarmos o oceano, salvamos o mundo todo", afirma ele convicto.
A constatação é necessária e adequada ao nosso tempo, já que são os oceanos os verdadeiros responsáveis por sustentar a vida na Terra. Cobrindo mais de 70% da superfície, eles são o lar de muitos milhares de espécies e a base do sustento de milhões de pessoas. Além disso, são o principal regulador do clima e produzem mais da metade do oxigênio do planeta.
Considerando ainda que mais de 80% do oceano é desconhecido pela ciência, pode-se afirmar que essa vasta área inexplorada representa um imenso potencial do ponto de vista econômico, de segurança alimentar e medicinal, para citar apenas os mais óbvios.
Nesse aspecto, o Brasil é um país bastante privilegiado. Temos uma das maiores costas marítimas do planeta, com mais de 7 mil quilômetros de litoral banhado pelo Oceano Atlântico. Nossa Zona Econômica Exclusiva (ZEE) totaliza 5,7 milhões de quilômetros quadrados. Também está aqui, mais especificamente entre os estados do Amapá e Maranhão, a maior área contínua de manguezais do mundo, ecossistemas que respondem pelo armazenamento de carbono em até cinco vezes mais do que as florestas tropicais.
No entanto, apesar de todos os benefícios que nos proporciona, insistimos em não cuidar do maior sistema de e à vida do planeta. Enquanto deveríamos estar trabalhando para a restauração da sua saúde, que já dá evidentes sinais de profunda vulnerabilidade, estamos intensificando as ameaças com as mais diversas tipologias de contaminação, sobrepesca, mineração, acidificação e o seu aquecimento. O que revela que somos, na realidade, um país de costas para o mar.
Com bastante atraso, algumas iniciativas multilaterais indicam que o mundo está um pouco mais atento à iminente necessidade de recuperação e proteção do maior bioma marinho global.
De amanhã até o próximo dia 13, por exemplo, a França hospeda a 3ª Conferência dos Oceanos da ONU, que tem como uma de suas prioridades "o fortalecimento e a disseminação do conhecimento ligado à ciência marinha para aprimorar a formulação de políticas". Salvaguardar esse imenso sumidouro de carbono e reservas de biodiversidade ainda inimagináveis, compostas por recifes de corais, manguezais, o mar profundo, zonas costeiras e estuários, entre outros, é uma missão que envolve todos os Estados-membros, a sociedade civil e o setor privado.
Outro esforço internacional acontecerá em agosto na Suíça, quando será realizada a 6ª rodada de negociações para a elaboração de um Tratado Global Contra a Poluição por Plástico, também no âmbito da ONU.
No Brasil, dois Projetos de Lei (PL) tramitam no Senado Federal com o mesmo propósito de recuperar a saúde dos oceanos. O PL 2.524/2022 propõe soluções concretas para a implementação de uma ampla mudança no sistema linear de produção, uso e descarte do plástico — que quase sempre termina no próprio oceano. Maior produtor de plástico da América Latina e 8º maior poluidor do mundo, o Brasil está bastante atrasado. Enquanto mais de 140 países já adotaram leis com algum nível de restrição aos itens descartáveis, seguimos sem nenhum tipo de legislação nacional nesse sentido.
Já o PL 4.789/2024 veio para instituir uma nova Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Pesca, visando à continuidade da atividade com gestão baseada na ciência e o bem-estar das comunidades pesqueiras artesanais.
Neste 8 de junho, data em que celebramos o Dia Mundial dos Oceanos, lembramos que ainda é possível recuperar a abundância desses ecossistemas vitais para a nossa permanência na Terra. Cabe especialmente aos tomadores de decisão e ao setor produtivo transformar o mar de discursos em um oceano de compromissos e realizações concretas. O tempo de proteger o que nos protege é agora.