
A Polícia Federal encaminhou, nesta quarta-feira, o pedido formal de inclusão da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) na lista de difusão vermelha da Interpol. A ação ocorreu por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que também ordenou a prisão preventiva da parlamentar, entre outras medidas.
O pedido foi enviado para a sede da Interpol em Lyon, na França. Caberá à instituição analisar e deliberar sobre a inclusão. Zambelli deixou o país nesta semana, quase 1 mês depois de ser condenada pela Primeira Turma do STF por invasão ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Moraes também marcou uma sessão da Primeira Turma, na sexta-feira, para julgar o recurso da defesa da deputada contra um pedido de prisão preventiva. Na decisão, o ministro ordenou o bloqueio de todos os aportes da parlamentar, inclusive, o diplomático, bem como de seus bens, contas bancárias, investimentos, veículos, imóveis, embarcações e aeronaves. As medidas visam garantir o pagamento das multas e a reparação dos danos, cujo valor mínimo foi fixado em R$ 2 milhões.
Foi determinado também o bloqueio de todas as redes sociais utilizadas por Zambelli. O conteúdo das contas deverá ser preservado pelas plataformas, e os dados cadastrais enviados ao STF. A Câmara dos Deputados será notificada para bloquear salários e quaisquer verbas destinadas à parlamentar, redirecionando os valores ao pagamento integral da multa.
Com a decisão desta quarta-feira, o ministro atendeu a um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR). O chefe do órgão, Paulo Gonet, afirmou que não se trata de antecipação de cumprimento de pena e que a prisão é necessária para assegurar a aplicação da lei penal. O ministro concordou com o argumento.
"A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido da decretação da prisão em razão da fuga do distrito da culpa, quando demonstrada a pretensão de se furtar à aplicação da lei penal", diz trecho da decisão.
O magistrado afirmou que, após a saída do país, Zambelli "declarou que pretende insistir nas condutas criminosas, para tentar descredibilizar as instituições brasileiras e atacar o próprio Estado Democrático de Direito".
"Lamentavelmente, o intuito criminoso de Carla Zambelli permanece ativo e reiterado, insistindo a condenada — mesmo que de modo atabalhoado e confuso — na divulgação de notícias fraudulentas, no ataque à lisura das eleições e nas agressões ao Poder Judiciário", escreveu Moraes.
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De acordo com a Polícia Federal, Zambelli saiu pela fronteira terrestre com a Argentina em 25 de maio, por meio de Foz do Iguaçu (PR). Por meio de nota, a parlamentar afirmou que a determinação do STF pela sua prisão preventiva é “ilegal, inconstitucional e autoritária".
Na terça-feira, ela informou publicamente que deixou o Brasil e está nos Estados Unidos, com planos de seguir para a Europa. Disse ter planos de se estabelecer na Itália, pois tem dupla cidadania. No entanto, segundo especialistas ouvidos pelo Correio, o aporte europeu não impede uma possível extradição da parlamentar.
A extradição é o processo oficial pelo qual um Estado solicita e obtém a entrega de uma pessoa condenada ou suspeita de cometer um crime. A advogada Beatriz Alaia Colin, especialista em direito penal, aponta que a dupla cidadania da parlamentar pode atrasar, mas não inviabilizar o processo.
"Mesmo com cidadania, em casos de crimes graves, os países da União Europeia têm mecanismos de cooperação jurídica que podem levar à entrega de um cidadão para responder por crimes em outro país-membro, ou mesmo para países fora da UE, mediante acordo de extradição", destacou.
Tratado
Marcelo Crespo, coordenador do curso de direito da ESPM, explicou que a inclusão na lista da Interpol pode demorar de 3 a 8 semanas para ser concretizada. Ele lembrou do caso do ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, que fugiu para a Itália após ser culpado de participar do mensalão. Mesmo com cidadania, ele foi extraditado em 2015.
“A Itália deve fazer a análise da nacionalidade primária. Se ela (Zambelli) teve educação, estudo ou qualquer outra relação com o país, por exemplo, além de simplesmente ter um aporte. Então, o fato de ela não ter ligações com a Itália e estar buscando apenas e tão somente um refúgio para fugir da sua punição no Brasil”, ressaltou.
A Itália e o Brasil am tratado de extradição no final dos anos 1980, com promulgação pelo Congresso em 1993. Em função disso, pode ser concedida a extradição por fatos que, segundo a lei dos dois países, sejam considerados crimes puníveis com uma pena privativa de liberdade superior a um ano, ou mais grave.
"Uma vez com a prisão preventiva decretada e, depois de um procedimento na Interpol de análise sobre a natureza do crime cometido, é emitido um alerta de difusão vermelha pela Interpol, e ela a a ser considerada procurada também pelas polícias correlatas à Polícia Federal nos demais países, que, em síntese constitui a Interpol", explica o advogado Max Telesca.
Processos
Zambelli responde a dois processos no STF. Um deles trata da perseguição armada a um homem na véspera da eleição presidencial de 2022, sob relatoria do ministro Gilmar Mendes, que propôs uma pena de 5 anos e 3 meses de prisão. A ação está suspensa por um pedido de vista (mais tempo de análise) do ministro Nunes Marques.
Paralelo a isso, há a condenação por invasão ao sistema do CNJ. Os ministros definiram 10 anos de prisão para a parlamentar, além da perda de mandato, inelegibilidade e pagamento de multa. Segundo a investigação, os condenados — Zambelli e o hacker Walter Delgatti Neto — invadiram seis sistemas do Judiciário por 13 vezes. Eles inseriram 16 documentos falsos, incluindo um mandado de prisão contra Moraes e ordens para quebra de sigilo bancário e bloqueio de bens do magistrado. A PGR atribuiu 10 crimes à parlamentar, suspeita de ser a mandante das ações criminosas. Na Justiça Eleitoral, ela foi condenada à cassação e à inelegibilidade por uso indevido dos meios de comunicação e abuso de poder político.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) deverá contatar as autoridades estrangeiras para, conforme o acordo entre os países e a legislação italiana, solicitar o cumprimento da decisão na Itália.